sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Polícia Militar - Um pesadelo carioca


Prezado Jornalista Ricardo Boechat


Rio de Janeiro, 12 de dezembro de 2008.

Mais uma vez dirijo-me a VS para me manifestar sobre a atuação medonha da Polícia Militar do Rio de Janeiro.
Da vez anterior essa atuação desastrada, desordenada, medíocre e incompetente resultou na morte do menino João Roberto Soares, de três anos. Na Tijuca...no asfalto...na cara e no coração da classe média tijucana.
Ontem, um de seus “supostos” assassinos, “valoroso” membro dessa Corporação, foi absolvido , mesmo depois de disparar 17 tiros de fuzil contra João Roberto, sua mãe e irmão.

Hoje, por volta das 18 horas, na Rua Paula Souza (Maracanã- Tijuca), uma viatura da PM, repleta desses “valorosos” servidores públicos militares, teve de interromper sua perseguição, sabe-se lá a quem, pois, na contra-mão, deparou-se com um táxi que trazia uma família inteira. Todos meus afilhados. Os pequenos Raul (três anos) e Clarice (seis anos), acompanhados de seus pais e do motorista. Este último, perplexo, parou seu táxi, bloqueando a contra-mão que os policiais queriam fazer. E não poderia dar marcha-a-ré, posto que o fluxo do tráfego o impedia. Resultado : a família inteira e o motorista (chefe-de-família) viram os fuzis apontarem para eles, com raiva, querendo cuspir fogo e chumbo.E cuspiram !! Para o alto, dezenas de tiros! Como se não houvesse edifícios e transeuntes em rua tão movimentada, e como se balas não ricocheteassem. Todos no táxi se abaixaram. Os “valorosos” então saltaram de seus carros-de-combate e, furiosos, abordaram o motorista, com xingamentos dos piores e atitude ameaçadora, para que, de qualquer jeito, lhes desse passagem.

Queriam chegar à Rua Isidro de Figueiredo, onde a creche-escola Babás e Bebês, dava saída às crianças. Lá foram disparados mais de 20 (VINTE) tiros. Mas todos para o alto...”sem perigo algum”! Foi de lá que saíram a família citada ao cimo e o taxista.

...A “perseguição” que resultou em NADA, estendeu-se até a Rua Mariz e Barros, passando as viaturas, com direito às sirenes, homens “valorosos” em carro aberto com fuzis em riste, passando pelas ruas principais e secundárias do trecho a que me referi. Algumas delas: General Canabarro (Colégio Estadual Ferreira Viana), Rua Moraes e Silva (IBEU), Prof. Gabizo (Colégio Municipal, academias de ginástica etc), Oto de Alencar (Unidade Tijuca I do Colégio PedroII... onde funciona o antigo primário), Rua São Francisco Xavier (Colégio Militar e Unidade Tijuca II do Colégio Pedro II). Meu local de trabalho, desde 1983.

Por sorte, estamos em época de recesso escolar e o movimento de alunos e professores nestas instituições está diminuído, mas não inexistente ! Muito menos nas creches!!

...E não por coincidência, este que vos escreve, atravessava a faixa de pedestres (sinal vermelho para as máquinas e verde para os humanos) por volta das 18:15horas, no cruzamento das Ruas Mariz e Barros e São Francisco Xavier, onde resido, dirigindo-me ao Pedro II para um conselho-de-classe, quer dizer, cerca de 15 minutos após o incidente com meus afilhados, quando percebi o alvoroço dos motoristas. Todos desesperados tentavam, sem avançar o sinal (pois muitos além de mim estavam atravessando) dar passagem para a tresloucada viatura, que além do som ensurdecedor de suas sirenes contava com os palavrões berrados pelos homens “valorosos” de fuzis erectos ! E agora, com todas as vênias que se possa pedir, transcrevo o que berravam os soldados para nós transeuntes-contribuintes-empatadores-de-perseguição, IN VERBIS : “sai daê seus porra!!! “, “ anda porra....boraê seu merda!!”. Este último, o “merda”, era eu. Só que eu não corro. Sou aleijado, não deficiente. Ando devagar porque perdi 75% da força da perna equerda e 10% da direita. Sofro de estenose (fechamento) do canal medular, sofri duas cirurgias, uma em 1973, outra em 2002. Tenho oito estruturas de metal em minha coluna vertebral. E tenho dores crônicas. Deus sabe como eu gostaria de poder correr. A descarga adrenérgica foi inevitável, sempre é, e muito mais indignado do que revoltado, parei de andar e respondi aos xigamentos em nível quiçá inferior ao deles. Passaram pelo meu lado, sempre xingando e ostentando a dureza de seus fuzis. Retornei à casa...tomei 10 mg de benzodiazepínicos, um beta-bloqueador (anti-hipertensivo...estava com 20 por 12...sou hipertenso) e um anti-arrítmico (para cessar a taquicardia). Daí tomei de novo o rumo do Pedro II onde me esperavam para trabalhar.

Retornei por volta das 21:30h...religuei o celular...e meu afilhado ligou, contando sobre o estado alterado em que se encontrava, ele a família, e o que havia provocado isso. Só bem mais tarde contei a ele, em outra ligação, do que todos fomos vítimas.


Não consigo deixar de associar este comportamento dos “valorosos” membros da PM/RJ, ao sentimento de impunidade e, pior, de poder matar impunemente, que lhes deve ter invadido as almas, após o resultado do julgamento de ontem...ou anteontem, pelo adiantado da hora.

E penso muito na resposta que VS redigiu ao “e-mail” que lhe enviei em 08 de julho, sobre como se sentiu ao reportar o assassinato do pequeno João Roberto e dando voz ao coração ferido daquele pai que, muito mais agora, está despedaçado. E disse VS: “...centenas de mensagens chegaram, tocadas da mesma forma. Não serão suficientes para mudar nada, receio. E continuaremos pranteando inocentes”.

Rogo pelo seu perdão se me alonguei, mas tal como fiz em minha mensagem anterior, retomo as palavras irretocáveis do Dr. Rui Barbosa para me despedir e, do fundo do coração agradecer vossa atenção. Colho também a oportunidade para desejar que VS sinta-se a vontade para fazer uso do conteúdo desta mensagem, a qualquer tempo e em qualquer foro, para o quê sotoponho meus dados pessoais.

Muito atenciosamente,

Prof. Dr. Haroldo Nobre Lemos
RG: 3752891- IFP/RJ
End.: Rua São Francisco Xavier, nº 169-A, casa 18, Tijuca
Tel: 3079-1539 e 9396-2733.

A IRA DOS BONS (RUI BARBOSA em 1919).
Nem toda a ira, pois, é maldade; porque a ira, se, as mais das vezes, rebenta agressiva e daninha, muitas outras oportuna e necessária, constitui o específico da cura.(...) Quando um braveja contra o bem, que não entende, ou que o contraria, é ódio iroso, ou ira odienta. Quando verbera o escândalo, a brutalidade (Polícia Militar), ou o orgulho (Sérgio Cabral), não é agrestia rude, mas exaltação virtuosa; não é soberba que explode, mas indignação que ilumina; não é raiva desaçaimada, mas a correção fraterna. Então, não somente não peca o que se irar, mas pecará, não se irando. Cólera será; mas reflete a de Deus, face também celeste do amor, da misericórdia e da santidade. (as inserções:Polícia Militar, Sérgio Cabral e grifos, são de minha autoria).

Prof.Dr. Haroldo Nobre Lemos.